ENREDO
E finalmente chega a aventura final de Assassin’s Creed. Pode ser estranho para quem não é ligado na série, mas Assassin’s Creed III é na verdade o quinto jogo da série principal da franquia! Isso porque Ezio (o protagonista do segundo jogo) pegou dois jogos a mais: Brotherhood e Revelations.
Mas então a Ubisoft decidiu parar com isso e colocar um fim às memórias dos ancestrais de Desmond, protagonista da série toda, que revive as memórias de seus antepassados que estão embutidas em seu DNA, através de uma máquina chamada Animus. Toda essa ideia de reviver as memórias tem base em um cataclisma iminente que se aproxima da humanidade, cabendo a Desmond se colocar na pele de seus antepassados para encontrar artefatos e pistas que o ajude a parar essa tragédia.
Com a Apple of Eden em mãos, Desmond e sua equipe agora precisam encontrar uma chave específica que abre um portal em uma caverna construída por seres além da compreensão humana, onde então o fim do mundo poderia ser evitado. E é na busca dessa chave que entra o papel do último ancestral: Ratonhnhaké:ton.
Mas como esse nome está na língua no idioma indígena dos EUA, o jogo oferece um nome mais simpático às nossas línguas: Connor, um nativo americano do século XVIII, antes da Revolução Americana acontecer de fato.
Antes de conhecer Connor, no entanto, somos apresentados ao seu pai, Haythan Kenway, um inglês que vem para os Estados Unidos em busca de informações sobre “Aqueles que vieram antes”, ou seja, os seres místicos, bem antes do nascimento de Connor. Conhecer Haythan antes do protagonista do jogo em si é excelente para o enredo, pois ele é um personagem pivô na trama de Assassin’s Creed III. E conhecendo ele, de quebra também acabamos conhecendo todo o pessoal que o cerca.
Tudo isso consegue fazer o jogador ficar preso na história do jogo. Isso sempre foi marca da série, porém dessa vez é algo muito mais elevado, Assassin’s Creed III conta com uma ligação jogador-personagens muito maior do que antes, quando nossa ligação mais forte era no máximo com os protagonistas Altair e Ezio. Agora essa ligação está em outro nível, os personagens são mais expressivos e conhecê-los mais detalhadamente é o que dá margem para isso.
Outro ponto fenomenal do enredo de Assassin’s Creed III são algumas reviravoltas, que deixam o jogador aturdido e uma delas é um “mindfuck” total, digno de “When you see it, you’ll shit bricks”. Essa característica também faz o jogador ficar muito imerso na trama, vendo todos os detalhes e conferindo cada cena e conversa, pois a qualquer momento pode acontecer algo diferente.
Agora, em relação à reconstrução histórica do período da Revolução Americana, mais uma vez a série deu um show. O cuidado para apresentar personagens famosos como George Washington é algo difícil de se ver até mesmo em filmes que retratam a época, a fidelidade das vestimentas dos personagens, os prédios e, inclusive, os próprios fatos, são de extrema qualidade e aguçam a curiosidade do jogador para ir saber mais sobre todo esse universo.
O jogo bombardeia o jogador com informações o tempo todo, que podem ser vistas em forma de base de dados bastante detalhadas, como uma mini wikipédia. Absolutamente qualquer coisa famosa, como um prédio, um fato ou uma pessoa famosa (ou pelo menos pivotal para o enredo do jogo, mesmo que fictícia) aparece detalhada, com curiosidades e um resumo de sua vida e obra.
Não há receio em dizer que é o melhor enredo da série, o que mais prende e o que mais faz o jogador ter um elo de ligação forte com seu elenco.
JOGABILIDADE
Assassin’s Creed III é um jogo sandbox, que bebeu enormemente da fonte de Red Dead Redemption. Sendo Connor um indígena, é natural que ele seja um expert em caça e sobrevivência na selva, e é nesse ponto que o jogo se parece bastante com o faroeste da Rockstar.
Não mais concentrado em somente uma cidade (como foi em Brotherhood e Revelations), o jogo possui duas cidades grandes (Nova York e Boston), uma fazenda e uma área enorme chamada Fronteira. As side quests mais diversas estarão na fronteira, com desafios de caça, fronteiriços contando suas histórias, missões para melhorar as provisões da fazenda de Aquiles (tutor de Connor) e outras. É na Fronteira que é possível sentir esse clima de Red Dead Redemption, seja pela vastidão do cenário, seja por eventos aleatórios, seja por animais selvagens, seja pelos desafios.
Em Nova York e Boston também há muito o que se fazer, com missões de liberação, ataques a fortes inimigos, compra de produtos e muitos outros. A cidade dificilmente vai deixar o jogador enfadado, mas é na Fronteira que as coisas realmente acontecem com mais diversidade.
O problema é que tal mundo aberto com muitas possibilidades demora muito para realmente surgir para o jogador. Assassin’s Creed III tem o início mais lento de toda a série, uma introdução longuíssima e que pode ser frustrante. Demora em demasia para o assassino Connor, vestido com sua túnica estilosa da Irmandade dos Assassinos, realmente dar as caras.
Isso dá a aparência de ser um grande tutorial. Aliás, um enorme tutorial, ensinando várias das possibilidades do jogo (sejam elas novas ou antigas na série). Uma escolha sábia para o enredo, que se tornou o mais íntimo da série, porém não é algo que vá agradar a qualquer um. Por isso, Assassin’s Creed III parece ter sido feito especialmente para agradar os já fãs da franquia, que sabem do potencial da série e que têm plena noção de que o jogo vai se mostrar logo após essas longas horas de introdução.
Outro problema do jogo, ainda em relação às side quests, é a forma como elas são apresentadas. Muitas delas deveriam ter sido apresentadas dentro das missões obrigatórias, pois aí seria possível ter uma visão do por que ir atrás de fazê-las. Essa falta de apresentação cria um certo receio e recusa por parte do jogador a fazer estas missões, que pipocam pela Fronteira e pelas cidades. É como se o jogo oferecesse absolutamente tudo ao jogador, mas desde que ele vá atrás por conta própria, muito diferente de antes, onde a série apresentava absolutamente todas as suas características (e sem a necessidade de uma introdução gigantesca e desanimadora).
Um exemplo da falha disso é o uso de uma nova, poderosa e estilosa arma: a rope dart. O jogo, durante uma missão principal, coloca o item no inventário de Connor, mas não o ensina a usar de forma perfeita. E o tutorial disso está em uma side quest, que nem no mapa aparece! Uma característica nova dessa não tem tutorial, mas escalar, o que é muito mais intuitivo e já marca registrada da série, possui um tutorial. No mínimo estranha a escolha da desenvolvedora de fazer dessa forma.
O gerenciamento de recursos da fazenda serve para obter, basicamente, mais receita, ou seja, dinheiro. Recrutando novos colonos e colocando-os para trabalhar, é possível enviar carroças para todo lugar. O problema é que o dinheiro em Assassin’s Creed III é algo muito mais supérfluo do que foi nos jogos com Ezio. Não há muita necessidade de se obter novas armas (a não ser munições, iscas para caça e armadilhas, que são ligeiramente baratos) e não há mais upgrade na armadura do assassino, nem mesmo há doutores vendendo remédio por aí (o que era muito necessário nos anteriores). Então, deixar a fazenda operando lindamente serve mais ao ego do jogador do que aos propósitos do jogo mesmo.
O combate não mudou tanto dos jogos anteriores, porém agora os inimigos estão mais agressivos e há mais possibilidades do que se fazer com eles. Basicamente, o jogo funciona na base do contra-ataque, dependente dos reflexos do jogador, e não em sua habilidade de fazer combos (para atacar, é só esmagar o botão), onde o timing é essencial para uma defesa bem sucedida e o inimigo abrir uma brecha para o contra-ataque. Como estamos no século XVIII, é normal que agora haja muito mais armas de fogo e muitas vezes Connor será alvejado, mas pode usar escudos humanos para se defender, o que é muito bom e simples. A variedade de inimigos, também aumentou, não só com armas diferentes, mas com posturas diferentes: uns não aceitam contra-ataques diretos, outros bloquearão suas investidas, ou preferirão tomar distância e tentar um tiro.
Para combater estes vários tipos de inimigos, Connor conta principalmente com seu machado tomahawk, rápido e mortal, juntamente com suas hidden blades. Mas nem todo ataque precisa ser violento, muitas vezes uma aproximação sorrateira é muito mais vantajosa, mesmo sendo bem mais difícil de não ser visto. E se a coisa apertar, é sebo nas canelas e correr, o que também está muito mais difícil do que antes, visto que muito mais guardas se juntam para correr, bloquear a passagem e alvejar Connor, e encontrar um lugar seguro para se esconder se torna bastante dificultoso, ainda mais se o nível de procurado estiver alto.
A movimentação do jogo está de alto nível, apesar de demorar um pouco para acostumar-se com a agilidade de Connor. Mas os botões respondem bastante bem, e a velocidade dele se torna algo natural, e as mecânicas de escalar segue como nos anteriores, tudo intuitivo e fácil, bastando apenas achar os pontos certos para acessar a plataforma seguinte. E agora com a adição de escalar árvores, fica ainda melhor, muitas vezes a melhor forma de acessar uma área mais alta é fazendo um arborismo. E todos sabem como é importante escalar em Assassin’s Creed, principalmente para conseguir visualizar novos pontos do mapa, sincronizando-o a partir de locais altíssimos.
Ponto baixo é para a movimentação sobre os cavalos, que é bastante bugada e muitas vezes deixa o jogador preso e travado.
As missões principais são todas muito variadas e possuem objetivos opcionais, que servem basicamente para achievements na PSN, Steam ou Xbox Live. Mas a vontade de fazer todos os opcionais vai ser bem alta, pelo nível de desafio, o que fará o jogador recarregar o último checkpoint muitas vezes! Os objetivos opcionais variam entre conseguir matar sem ser visto, conseguir eliminar alvos de determinadas maneiras, não perder tanta energia em batalhas, correr contra o tempo, e coisas do tipo.
Uma das novidades mais esperadas de Assassin’s Creed III era o modo de batalha naval. E superou todas as expectativas! Connor toma posse de um navio de guerra e deve ajustar suas velas conforme o vento e a necessidade, disparar os canhões, selecionar os tiros e muito mais. Essas missões são divertidas e desafiadoras, pois contam com mudanças de vento, outros navios atacando, obstáculos no mar e muito mais. Se não houver agilidade nos dedos e uma habilidade para controlar o navio, é morte na certa.
Após o longo início do jogo, quando ele realmente se mostra, percebe-se que Assassin’s Creed III é o mais variado da série, com muito o que se fazer, coletáveis e afins. O clima de sandbox é alto e até mesmo não fazer nada, apenas andar pela Fronteira e caçar pode se tornar algo prazeroso.
SOM
Simplesmente de primeira. Jesper Kyd se foi (uma pena, é um excelente compositor), mas Lorne Balfe (que ajudou Kyd em Assassin’s Creed Revelations) não deixou a bola cair. A série sempre foi sinônimo de qualidade de composições musicais, com músicas atmosféricas que caíam muito bem às situações e em Assassin’s Creed III não é diferente: orquestrações de altíssimo nível e músicas muito presentes (bem mais do que no jogo anterior da série).
O trabalho de dublagem (a original, a em português não saiu ainda) também é fantástico, inclusive com personagens falando bilingue muitas vezes, mas como agora a história se passa nos Estados Unidos, não é mais aquele inglês macarrônico da turma do Ezio. Os indígenas, por exemplo, só se comunicam entre si pela sua língua própria (aí o motivo do nome impronunciável por caras-pálidas de Connor), mas com legendas (essas já em português).
De resto, os sons ambientes, de explosivos, de gritarias pelas ruas, conversas, tiros e afins também são excelentes. A sonoplastia do jogo é algo sem falhas.
GRÁFICOS
O principal upgrade visual de Assassin’s Creed III em relação aos anteriores da série é na sincronização labial e nas expressões faciais durante as cutscenes. Um trabalho primoroso (claro que não é L.A. Noire) e fenomenal, com expressões bem mais realistas e a boca se movendo bem mais de acordo com o que se está sendo dito. Caso não seja uma cutscene, mas sim uma conversa normal, o detalhismo já não é tão alto, mas nem se faz necessário, na verdade.
Os modelos também estão muito mais robustos e bonitos, o principal é claro que é o de Connor, com animações suaves e realistas, mas até mesmo os modelos dos NPCs menores também são bem montados o suficiente para serem convincentes.
Mudanças climáticas também são belíssimas de se ver, principalmente a chuva, com raios que iluminam todo o cenário e a água caindo. É um dos efeitos mais bonitos do jogo, e também dessa geração de videogames. Falando em água, os efeitos do mar aberto quando em missões navais também são excelentes, com um oceano agitado, cheio de ondas e espuma, de forma bastante realista.
O mesmo não pode se dizer da água de rios e baías enquanto Connor está nadando, com respingos estranhos saindo mesmo com o jogador parado sem fazer nada, principalmente em uma cutscene, um efeito bem estranho.
Nos cenários e construções não se vê tanta diferença para o jogo anterior da série, mas os efeitos de iluminação melhoraram consideravelmente (experimente ficar parado embaixo de uma árvore que faz sombra, por exemplo, cada folha faz a diferença na hora da luz encontrar o corpo de Connor).
O jogo possui alguns bugs gráficos, uma vez um guarda foi subir em uma cerca e simplesmente voou, outra vez um npc sumiu e apareceu várias vezes, ou um cavalo travou na cerca e parecia estar tendo um ataque epiléptico. Mas o jogo é muito grande e variado, então isso é algo até esperado.
VEREDITO
Assassin’s Creed III tinha absolutamente tudo para ser o melhor da série, mas algumas escolhas estranhas, como uma introdução enormemente lenta e side quests mal apresentadas não o fazem ganhar o posto. É um jogo feito para os já fãs da franquia, não é aconselhável começar a jogar a partir dele caso os anteriores não tenham feito o seu gosto, mesmo você não ligando para o enredo. Mas o jogo tem muito brilho e figura entre os melhores do ano certamente, porque depois que as opções se revelam (ou que o jogador vai atrás de saber por conta própria) chega a hora de dizer: ISSO É ASSASSIN’S CREED!
NOTAS
ENREDO:
10,0
+ O melhor enredo de uma série com enredos fantásticos desde o primeiro jogo
+ Forte elo do jogador para com os personagens
+ Reviravoltas de tirar o fôlego
+ Um final coerente para Desmond
+ Reconstrução histórica mais uma vez fantástica
JOGABILIDADE:
8,0
+ Movimentação fluída
+ Novas opções de escalar
+ Combate mais dinâmico e inimigos mais agressivos
+ Muito o que se fazer pelas cidades e pela Fronteira
+ O jogo bebeu da fonte certa em vários pontos: Red Dead Redemption
+ Missões principais bastante variadas
+ Machado, rope dart, arco e flecha… as novas armas são excelentes
+ Capitanear o navio é uma das melhores coisas dos videogames
- Introdução lenta, grande e frustrante
- Muitas características novas mal apresentadas ou não apresentadas propriamente
- Cavalo bugado
SOM:
10,0
+ Músicas empolgantes
+ Dublagem excelente
+ Jogo poliglota
GRÁFICOS:
9,0
+ Iluminação
+ Efeitos da água do mar aberto são lindos
+ Modelagem dos personagens, expressões faciais e lipsinc primorosos
- Água estranha durante a natação
- Alguns bugs
By: Raphael Rossini